Ana Paula Henkel

Ana Paula Henkel, ex-jogadora de vôlei | por Heloisa Eterna | foto Daniela Dacorso | Julho 2017

ANA PAULA: “ANTES TRUMP DO QUE HILLARY”, DIZ A EX-MUSA DO VÔLEI, QUE ABRE O JOGO SOBRE POLÍTICA, ABORTO…

Ana Paula Henkel, você está partindo para uma nova profissão nos Estados Unidos (EUA). Qual é?

Moro aqui há mais de dez anos e vou me formar em Arquitetura de interiores na UCLA (Universidade da Califórnia, em Los Angeles). Tentei engatilhar um curso de Ciência Política e também assisto a palestras de políticos na universidade. É um tema pelo qual sempre me interessei. Meus pais foram politicamente ativos em casa, e aconselhavam a mim e à minha irmã a não deixar este assunto de lado, porque consideravam uma parte importante na vida do cidadão.

Casada com um americano, você vota aí…

Sim, tenho dupla cidadania. Voto normalmente.

Como tem visto a atual política dos EUA e a figura controvertida de Donald Trump?

Hoje a gente vive uma dicotomia perigosa, quase um fla-flu na política. Essa eleição foi muito diferenciada. Ambos os candidatos eram ruins. Tanto Trump quanto Hillary. A solução não é votar no menos pior. Mas era impossível votar na Hillary, sou conservadora, sou republicana. Embora tenha havido pontos positivos na administração do marido dela (o ex-presidente Bill Clinton). Meu candidato seria o John Kasich, que foi governador de Ohio. Por ironia, Trump se tornou o representante do partido Republicano. Essa eleição tinha um ponto chave: o eleito nomearia um juiz para a Suprema Corte. Foi minha única razão por apoiar uma possível candidatura de Trump. Fora isso, não vejo no Trump uma figura presidenciável. Quando ele está na TV, eu e meu marido ficamos até com medo do que a gente vai ouvir (risos).

Você concorda com ele em tudo?

Concordo com algumas políticas, que não vêm dele mas do partido Republicano e que não foram bem concluídas por Obama (o ex-presidente Barack Obama), como segurança nacional. Ele deixou bastante a desejar ao não checar refugiados e imigrantes entrando nos EUA. Como católica e cristã, acho que a gente tem que olhar para os refugiados com coração cristão, mas não podemos fechar os olhos para o terrorismo. No meio desses refugiados existem, sim, terroristas infiltrados. Crianças e mulheres poderiam ser checados de uma maneira mais branda. Meu filho tem treinamento na escola uma vez por semana contra ato terrorista. Passou a ser minha realidade viver com o perigo. Quanto ao sistema de saúde que o Trump quer implementar, não sei se é perfeito, mas o Obamacare (lei de 2010 que passou, entre outras coisas, a proibir seguradoras de variar os valores dos planos com base no histórico clínico ou no sexo) estava confuso, caro e as pessoas reclamando. Não vejo isso sendo divulgado na mídia. Então, às vezes, o que a gente fala é distorcido, porque a mainstream media está aí para fazer praticamente uma lavagem cerebral.

“Não votei nele. […] Mas, antes ele do que a Hillary.”

(Sobre Donald Trump)

Mas seu voto foi em Trump?

Não votei nele. A Califórnia é democrata até o último fio de cabelo. Meu voto ou do meu marido não ia fazer diferença. Não concordo com a figura não-presidenciável que ele é, acho que não representa o partido Republicano, o verdadeiro conservadorismo americano. Como aqui o voto não é obrigatório, não votamos. O Trump não era um candidato que representasse o partido que a gente acredita. Mas, antes ele do que a Hillary.

Como usuária assídua do Twitter, o que acha de Trump ter bloqueado quem discorda dele, como Stephen King (escritor de “O iluminado”)?

Como presidente dos EUA… É aquele famoso ditado: está na chuva para se molhar. Se um dia ele aparecesse na minha frente e falasse: “Se pudesse mudar alguma coisa em mim, o que você mudaria?”, eu responderia: “Para de tuitar”. A postura no Twitter, essa guerra que ele arruma com todo mundo, não é a postura de um presidente de uma nação como os EUA. Nesse sentido, ele não me representa.

Você não tem receio de se expor muito com seus tuítes, de não ser poupada quando as pessoas não concordam com você?

O país chegou num patamar que é inaceitável ficar conivente com o que a gente vê, não se expor, não tentar mudar alguma coisa. O Brasil atingiu níveis de corrupção em todas as esferas. Me proteger no silêncio para não ser criticada é falta de hombridade. Não é isso que quero passar para meus filhos. As críticas vão acontecer, mas o esporte me deu essa carapaça. Nem sempre fui idolatrada. Você seleciona o que é positivo e o que é ataque. Os ânimos estão acirrados. Quando partem para a ofensa, daí a gente bloqueia também. E segue o jogo (risos).

Seus comentários no Twitter sugerem que você  foi a favor do impeachment de Dilma Rousseff. Hoje, o sucessor da ex-presidente, Michel Temer, é acusado de crimes de corrupção. Se arrepende?

Não. Se não fosse o impeachment, muito do que está acontecendo talvez não estivesse sendo divulgado. O brasileiro maduro politicamente percebe que não existe mais A e B, que está todo mundo num barco com lama até o pescoço. Muita gente vem no meu Twitter e fala que apoiei o Aécio (senador Aécio Neves (PSDB), candidato à presidência da República em 2014, mais tarde suspeito de atos ilícitos). E agora? Muito simples. Se soubesse na época o que hoje é sabido por todos, não votaria em Aécio. Tudo é um processo de aprendizado. Da mesma maneira que hoje digo que retiro qualquer apoio a Aécio, que ele pague e seja preso como qualquer outro corrupto se for provado o que falam, também espero maturidade política do outro lado. Quero que Lula seja preso se for comprovado.

“Não há direitos que serão extintos.”

(Sobre reformas trabalhista e da previdência)

Você faz parte do #MoroBloco, grupo de famosos no WhatsApp que apoia o juiz da Lava Jato Sergio Moro. De acordo com um post seu, ”absolutamente todos” são contra a possibilidade de uma eleição direta caso Temer caia.

Volto à questão do conservadorismo, palavra pela qual as pessoas têm preconceito, e que não tem nada a ver ser contra casamento gay, contra direitos civis. Sou a favor de casamento gay, as pessoas têm mais é que ser felizes. Mas ser conservador é você se basear nas suas raízes, ser economicamente conservador, crer no Estado mínimo. No caso de eleição direta agora, sou a favor de seguir a Constituição. Vivo num país que respeita a Constituição em todos os cenários. Passar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional que permitiria a antecipação de eleição direta para presidente da República) nesse momento, com o Congresso como é… As pessoas dizem que não confiam num Congresso corrupto para votar uma eleição indireta, mas confiam para mudar a Constituição? Não que essa conversa seja inválida, mas o momento é tão caótico que qualquer coisa de supetão me deixa apreensiva.

No Twitter, você fez comentários favoráveis à reforma trabalhista. Mas uma pesquisa do instituto Vox Populi  indica repúdio quase unânime dos brasileiros às reformas do governo de Michel Temer, porque entendem que perdem direitos. 

Tenho andado com muito medo de pesquisa. Tanto pesquisa com ideologia à direita quanto à esquerda. Não sei como as perguntas foram feitas, até onde a informação correta foi passada para o entrevistado. Toda vez que comento alguma coisa sobre a reforma trabalhista, chega alguém falando que ela vai tirar alguns direitos do trabalhador. Eu pergunto: “Quais direitos serão tirados?”. E ninguém me responde. Porque não há direitos que serão extintos. Acho que a grande massa, que vive e depende dessas leis trabalhistas, ainda não entendeu o que significa a reforma, as coisas positivas. E que o futuro do Brasil pode ser muito comprometido se elas não acontecerem. Tanto a reforma trabalhista quanto a da previdência.

“Tinha um lado conservador nele que ele apreciava muito, que é o da meritocracia.”

(Sobre o filho)

Seu filho de 16 anos criou na escola um grupo que já tem mais de 500 adolescentes conservadores. A posição política dos pais influencia os filhos?

Influencia. No caso do meu filho, o que aconteceu foi vontade de entender de política. Dois anos atrás, ele tinha visão mais à esquerda, porque ainda não participava do âmbito das discussões daqui de casa. O que ele ouvia na escola, porque aqui também, por incrível que pareça, as escolas têm um viés de esquerda, ele chegava em casa repetindo. Nós começamos a orientá-lo não com nossa ideologia, mas na leitura. “Olha, se você quer achar as suas respostas, leia, participe de fóruns. E quem gosta de esquerda ou de direita lê isso”. Lógico que ele escuta as nossas conversas, começou a ler os livros que eu estava lendo. Meu filho percebeu que tinha um lado conservador nele que ele apreciava muito, que é o da meritocracia.

Já pensou em se candidatar na política?

Não pensei, não quero, não aspiro, não tenho o menor interesse em carreira política. As pessoas sempre me perguntam isso. Dizem que o Brasil está precisando de gente que não é relacionada com política, com o establishment. Mas minha briga, minha pressão é aqui de fora.

“Nosso dever é proteger qualquer vida humana. Sou contra o aborto.”

No cenário atual, você vislumbra um candidato ideal para a eleição de 2018, que escolherá o próximo presidente do Brasil?

Ainda não. Aprecio algumas coisas no Dória (prefeito de São Paulo João Doria, do PSDB), mas ele é de um partido que não acredito ser nem conservador nem de direita. Acho que o Brasil precisa de um partido, de um approach mais conservador. O Brasil é um país conservador, que é contra o aborto, contra a legalização das drogas. Não sou a favor do desarmamento… Mas é muito cedo para falar de candidatos sem ver a plataforma de nenhum deles.

Por falar em aborto, como você se posiciona?

Nosso dever é proteger qualquer vida humana. Sou contra o aborto. Mas mesmo sendo católica, vou também contra o preceito da minha igreja a respeito da contracepção. Sou a favor de políticas de educação contraceptiva. Isso dá um resultado muito mais eficiente do que aborto. Fui voluntária de uma ONG durante cinco anos, a Pregnancy Help Center, que ajuda mulheres grávidas que não tiveram coragem de fazer o aborto, mas não têm condição  psicológica, econômica ou social para ter a criança. E o approach não é: “Não acredito que você vai assassinar uma criança”. Não. É muito profissional. Tem que entender a situação em que a mulher se encontra.

Você foi considerada musa do vôlei. Ganhou três medalhas de ouro (Gran Prix de Voleibol), três de prata (Gran Prix, Campeonato Mundial e Copa do Mundo) e uma de bronze (Olimpíada). Alguma frustração no meio do caminho?

Foram duas olímpiadas na quadra, duas na praia. História é o que não falta, tanto de risos quanto de muita frustração. A medalha de bronze, da Olimpíada de 1996 (em Atlanta, EUA), representa uma frustração mas também uma grande alegria. Frustração porque perdemos aquela semifinal histórica contra Cuba, 3 a 2. A própria comunidade do voleibol mundial chamava de golden semifinal, porque sabia que quem saísse dali provavelmente ganharia a medalha de ouro.  E por um tropeço de Cuba na chave, nos encontramos antes. A matemática era encontrar Cuba só na final. A frustração foi perder aquele jogo. Mas um dia depois, sair do inferno astral e vencer a Rússia, também por 3 a 2… Foi a primeira medalha olímpica no vôlei feminino brasileiro. E é a única medalha que eu guardo.

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